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Personagens que reverberam inclusão e diversidade invadem quadrinhos
Com quase 60 anos de carreira, Maurício de Sousa continua investindo em histórias com cunho social, dialogando sobre inclusão, diversidade e cidadania
Maurício de Sousa é sinônimo de renovação. Aos 82 anos de idade — e quase 60 de carreira — o desenhista e cartunista continua apostando em novidades nos projetos da Maurício de Sousa Produções. No mês de setembro, o pai da Turma da Mônica foi homenageado em Brasília, no 2º Prêmio Cidadania Viva, do Instituto Viva Cidadania (IVC). O profissional foi lembrado pelos projetos, campanhas e ações sociais que realiza, utilizando os personagens dos quadrinhos como ferramenta de conscientização.
“São quase 60 anos e nem eu acredito que faz tanto tempo assim e que eu estava lá desde o começo”, conta o cartunista em entrevista ao Correio. Do começo da carreira até os dias de hoje, Maurício de Sousa transformou suas criações em meio de abordar a diversidade: além de tratar a inclusão de pessoas com deficiência (com figuras como Dorinha, Luca e Tati), Maurício tem investido na criação de personagens negros, por exemplo.
A menina Milena, criada em 2017, é a primeira personagem afrodescendente do sexo feminino nas criações do cartunista. Além disso, a Maurício de Sousa Produções criou, em 2016, o projeto #DonasdaRua, que fala sobre a força feminina e empoderamento por meio das histórias.
“Eles (os personagens) não levantam bandeiras, eles põem a mãozinha na bandeira que está passando. Eu sempre tentei fazer com que os personagens falassem do tempo que está correndo, do tempo que estamos vivendo, do dia e da hora”, ressalta o criador da Turma da Mônica.
Para o desenhista, os personagens das produções estão sempre atuais. Ele acredita que se manter antenado nas mudanças sociais é importante para continuar os trabalhos. “Isso é uma preocupação minha desde o início: chegar aos 60 anos de carreira com personagens míticos sem esmorecer, sem enfraquecer. Eles estão sempre contemporâneos. Eu acho que é um pouco do segredo do nosso sucesso”, ressalta.
O criador explica como surgiu a ideia de inserir novos personagens no leque de produções. “Fui sentindo falta de representantes das diversas áreas socias, representantes étnicos. E aí fui colocando, pinçando, e ao mesmo tempo estudando cada etnia, cada necessidade, cada problema que nós tínhamos. Nós viemos carregados de preconceitos”, conta Maurício.
Ele ressalta também que o processo de formação do contexto em que o personagem será inserido é bastante minucioso. O cuidado é tomado para que situações preconceituosas não tomem conta das histórias. “Com a Milena, menina negra que nós colocamos, vem a família toda dela. Vamos estudar quem faz o que e o que não podemos colocar. Uns amigos meus do Instituto Zumbi dos Palmares falaram ‘Maurício, evita de colocar que eles vivem de música e de futebol. Isso é chato e não faz bem’”, explica. Maurício revela que a mãe de Milena será veterinária e que, em breve, a família da garota começa a aparecer nos quadrinhos.
Duas perguntas / Maurício de Sousa
O senhor abordou diversas temáticas relacionadas à cidadania em suas produções. Em uma época conturbada como a que o Brasil está passando, o senhor cogita a criação de personagens ou campanhas que ensinem as crianças a terem noções de política e voto?
Estamos passando por mais uma crise. Eu assisti a quatro grandes crises… e passamos por todas. O tempo ajudou a carregar. O tempo ajuda passar qualquer coisa. As coisas se resolvem, depois vem outra crise. Temos que acostumar a enfrentá-las. Isso acontece, faz parte da natureza humana, faz parte da civilização. Colocar política ideológica, não. Isso não faz parte da minha natureza. Esperamos colaborar com projetos políticos que tenham alguma sintonia com o que nós achamos, pensamos e acreditamos.
Como vocês têm realizado esses projetos?
Na Controladoria Geral da União (CGU) temos um projeto lindo de ética e cidadania, que vai durar anos sendo apresentado para a criançada, mas ainda tem mais. Estamos fazendo coisas no exterior, estamos entrando nas escolas no Japão, estamos entrando nas bancas de jornal no México, vamos entrar em janeiro nos Estados Unidos com revistas da Turma da Mônica Jovem. Não estamos parados, porque o mundo é cheio de oportunidades, cheio de atrações para quem cria. Eu sou criativo, boa parte do meu pessoal também é criativo, nós temos uma tribo lá muito gostosa, criando e espalhando o que nós sabemos fazer, que é espalhar mensagens positivas, criativas, alegres.
Além da Mônica
Conheça personagens de Maurício de Sousa que representam diversidade e inclusão social
Dorinha
Criada em 2004, Dorinha é uma personagem com deficiência visual. A inspiração para o surgimento da garota nos quadrinhos foi a pedagoga Dorina Nowill, atuante na defesa dos direitos das pessoas cegas.
Milena
A primeira personagem negra do sexo feminino, Milena, surgiu na turminha em dezembro de 2017. O autor das histórias adiantou que, em breve, toda a família da garota deve aparecer nos quadrinhos.
Luca
O personagem Luca é cadeirante e integrou a turminha em 2004. Apaixonado por esportes, o garoto é conhecido carinhosamente entre os amigos como “Da Roda”
Tati
A garotinha Tati é a primeira personagem de Maurício de Sousa com Síndrome de Down. Ela apareceu nas histórias em 2015, na revista Viva as diferenças.
*Estagiária sob supervisão de Vinicius Nader
Correio Braziliense – 02/10/2018