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Entrevista: “Adilson usa a imagem de Bolsonaro para dar um golpe no Patriota”, diz vice-presidente
Em entrevista exclusiva, Ovasco Resende fala da instabilidade que a possível filiação do presidente tem causado, com risco de implosão da legenda
Como O Antagonista noticiou mais cedo, em primeira mão, o presidente do Patriota, Adilson Barroso — que não tem mais atendido as ligações nem respondido às mensagens deste site –, convocou uma nova convenção do partido para a próxima segunda-feira (14).
O objetivo desse movimento de Adilson é claro: tentar minimizar os estragos da reunião do último 31, quando ele “tratorou” para anunciar a filiação do senador Flávio Bolsonaro e, após manobrar para forçar uma maioria, mudar o estatuto do partido, abrindo caminho para a filiação do presidente da República, que continua em busca de uma legenda para concorrer à reeleição em 2022, após a fracassada tentativa de criação da Aliança pelo Brasil.
Em entrevista exclusiva, o vice-presidente do Patriota, Ovasco Resende, voltou a dizer que Adilson, que virou seu inimigo, “está aplicando um golpe” para que a família Bolsonaro e seu grupo político “tomem o partido” e “entrem pela porta dos fundos”. “Nunca vi um partido que se posiciona como de centro-direita ou de direita querer invadir propriedade”, provocou ele.
Otimista com as ações na Justiça que tentam anular a convenção do último dia 31, Resende acumula um sentimento de apreensão, pois admite temer que a judiciliazação do caso em ano pré-eleitoral imploda o partido, que já começa a ver uma debandada. Em nota de exigência emitida ontem, como noticiamos, o Cartório do 1º Ofício de Notas do Distrito Federal (leia aqui a íntegra) cobrou explicações de Adilson sobre a desastrosa reunião na qual Flávio já discursou como manda-chuva da sigla.
Resende também revelou a O Antagonista que Adilson tem “a ganância e a vontade cega de ser eleito deputado federal” no ano que vem e acrescentou que, no entender dele, ainda há muito o que se investigar sobre o interesse do presidente da sigla em atrair a família Bolsonaro, que desdenhou dele em 2017 — naquele ano, o então deputado Jair Bolsonaro chegou a assinar a ficha de filiação ao partido, mas acabou selando aliança com o PSL, pelo qual seria eleito presidente no ano seguinte.
Leia a íntegra da entrevista com Ovasco Resende, vice-presidente do Patriota:
O Patriota será o partido de Bolsonaro?
Só se houver uma conversa de verdade entre as lideranças das diferentes alas do partido. Se o grupo do Adilson se reunir conosco e houver uma composição, uma conversa para a gente saber como eles [a família Bolsonaro] estão vindo e como está sendo formatado isso.
Essa obscuridade nas tratativas do Adilson com a família Bolsonaro nos leva a ter muitas dúvidas sobre a forma como isso está acontecendo. Mas sabemos que é uma forma, no mínimo, estranha. O que foi aquela reunião [a convenção do último dia 31]? Isso tudo nos preocupa muito.
O Adilson está fazendo com que o presidente da República não entre no partido pela porta da frente, mas pela porta dos fundos. Não estamos entendendo. Há um monte de irregularidades nesse processo. Ele [Adilson] fez aquela convenção de forma criminosa. Não está cheirando bem. E nós não somos mais meninos.
Quando o senhor soube que o partido, do qual é vice-presidente, estava negociando uma possível filiação do presidente da República?
De fato mesmo? Na convenção de 31 de maio. Porque, em todas as vezes que a gente questionava o Adilson sobre essas conversas com o Bolsonaro, ele dizia que era ‘conversa de jornalista’. Foi assim quando O Antagonista noticiou. Mas a gente está rodando o país, a gente tem bancada na Câmara, a gente tem parceiro aqui e acolá e sabia que estavam ocorrendo essas conversas. Só que ele sempre desmentia, sempre negava. Hoje, já sabemos que, desde 2017, o Adilson nunca parou de procurar o Bolsonaro.
A convenção do último dia 31, me permita dizer, foi uma zona. As reuniões de vocês são sempre daquele jeito?
Nunca, nunca, nunca. Nunca houve aquilo ali, entendeu? Nossas reuniões sempre foram marcadas por muitas discussões, mas eram coisas que se resolviam. Tem muita coisa ali [na convenção do dia 31] que ainda estamos investigando. O que o Adilson fez ali é coisa absurda, está fora de qualquer condição humana para classificar.
Mas tente: como o senhor classifica a postura do Adilson?
É uma traição enorme com a gente. Um golpe. Ele aplicou um golpe e está aplicando um golpe. O Adilson usa a imagem de Bolsonaro para dar um golpe no partido. Porque ele pensou que fosse fazer uma convenção daquele jeito, a toque de caixa, e fosse dar certo. Mas eles perderam, já viram que não será aprovado o que eles fizeram [as mudanças no estatuto, por exemplo].
Por isso, o Adilson está apavorado e desesperado para fazer uma outra convenção. Por que ele está agindo novamente assim? Porque sabe que tudo o que fez será anulado. Nós entramos com ações para derrubar a convenção e vamos conseguir. Aquilo ali não tem cabimento.
Sobre a questão de possível filiação do Bolsonaro, seria uma outra instância. Na hora em que esta situação atual estiver resolvida, se for resolvida, nós vamos, dentro da legalidade, ouvir o grupo, ouvir a família Bolsonaro, ouvir o que eles têm a dizer para nós, o que eles querem.
Então, o senhor não é contra a filiação de Jair Bolsonaro ao seu partido?
A questão não é ser contra ou a favor. Como ele vai se filiar? Essa é a questão. Nós temos deputados federais, que precisam de suas reeleições. Existe toda uma complexidade, existe um monte de coisa que a gente conseguiu fazer após a junção do PRP com o Patriota [em dezembro de 2018]. Como a gente vai jogar tudo isso fora?
Todos os 27 diretórios do Patriota precisam ser escutados, um a um. Eu não posso falar que sou contra ou a favor. Precisamos conversar com o presidente da República e ele dizer para nós, cara a cara, olho no olho: ‘ó, é isso, isso e isso’. E, se não der certo, ‘obrigado e até logo’.
Mas, desculpe, vocês sabem o que Bolsonaro quer: ele estava procurando um partido para chamar de seu, com porteira fechada. Mesmo que a situação atual seja resolvida, vocês topariam isso?
Não, não. Porque é o seguinte: essa questão de o Bolsonaro querer um partido para ele é uma falta de consideração com o que estamos fazendo aqui há mais de dois anos, entendeu? Como é que a gente vai entregar o partido?
É a mesma coisa de eu estar construindo uma casa linda e maravilhosa, com tudo certinho e organizado, e a gente sai e entrega a casa para outro. Aí eu passo na frente da casa de vez em quando e falo: ‘olha aí a casa que eu construí, mas não posso entrar mais nela, porque fui expulso dela, fui invadido’.
Nunca vi um partido que se posiciona como de centro-direita ou de direita querer invadir propriedade. O que o Adilson e a família Bolsonaro estão fazendo é exatamente isto: invasão de propriedade, algo que, em tese, eles tanto condenam. Eu nunca vi isso. Mas como o Adilson não tem ideal, não tem nada, ele está querendo invadir a nossa propriedade e deixando a família Bolsonaro invadir a nossa propriedade.
Por que o Adilson quer tanto o Bolsonaro no partido?
(Silêncio) Olha, nós temos aí algumas coisas. Ele tem, assim, a ganância e a vontade cega de ser eleito deputado federal no ano que vem. E o resto eu não sei, não sei… Mas é muito pouquinho [querer ser deputado federal] para fazer o que ele está fazendo, né? Tem muita coisa aí, muita coisa aí.
A questão está judicializada e estamos a um ano e quatro meses das eleições. Vocês não temem uma debandada? Não temem que o partido imploda desse jeito?
Não tenha dúvidas de que existe esse risco. Nós vamos perder muito com essa instabilidade. Vamos perder os bolsonaristas e também quem não é bolsonarista dentro do partido, porque a insegurança que o Adilson criou é muito grande.
E essa situação será colocada nas costas do Adilson. Ele está acabando com o partido, está colocando fogo no partido. São atitudes impensadas, insanas. Está todo mundo do Patriota, em todos os estados, sem saber o que fazer, todo mundo preocupado. O Adilson criou um clima no partido, mesmo entre os bolsonaristas, que é uma incógnita muito grande. Como vai ser? Não sabemos. É por isso que estamos abertos ao diálogo, apesar de tudo. Não podemos jogar tudo para o alto.
*Com informações do O antagonista – 11/06/2021