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Direitos das Pessoas com Deficiência: Privilégios ou mecanismos para redução das desigualdades?

Não bastasse a apresentação de projeto de lei pelo Governo Federal tendente a esvaziar as cotas de emprego para pessoas com deficiência (PL 6159/2019).

O portal de notícias da Globo – G1 republica,  no dia 5/12/2019, uma notícia publicada em 30/11/2015 sobre um outdoor em Curitiba com o seguinte apelo: “PELO FIM DOS PRIVILÉGIOS PARA DEFICIENTES“.

O “protesto”, assinado pelo Movimento pela Reforma de Direitos, reivindicaria: redução em 50% das vagas exclusivas para deficientes; fim das cotas para deficientes em empresas; redução em 50% de filas e assentos exclusivos para deficientes; fim da isenção de impostos na compra de carro zero; fim das cotas em concurso público; fim da gratuidade.

Ainda de acordo com a matéria publicada no G1, a fanpage do “movimento” indicaria o seguinte objetivo: “Queremos parar de ser prejudicados por leis que privilegiam uma minoria e esquecem a maioria”.

A republicação faz breve menção indicando que o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Curitiba teria sido o responsável pela publicidade, “com a intenção de que aqueles que se revoltassem com a mensagem passassem a defender os direitos da pessoa com deficiência”.

Mas, afinal, tais direitos e garantias conferidos às “pessoas com deficiência” (e não “deficientes”, como constou no outdoor), podem ser considerados privilégios?

O art. 3º da Constituição Federal inclui, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, “…reduzir as desigualdades sociais e regionais” (inc. III). Ninguém, em sã consciência, poderia negar que a deficiência (física, mental ou sensorial) coloca a pessoa em situação de desigualdade em relação às demais pessoas, sem deficiência. Permito-me alguns exemplos, nas questões relacionadas às “reinvindicações” acima mencionadas:

Vagas exclusivas (5%): Estacionar próximo das entradas, para pessoas sem deficiência, representa comodidade, celeridade e conforto; para a maioria das pessoa com deficiência, é condição para a efetiva inclusão e utilização dos espaços públicos: primeiro pela dificuldade (e muitas vezes impossibilidade) de deslocamento de grandes distâncias; segundo, porque nossas cidades não são acessíveis, de forma que normalmente apenas existe uma rota acessível entre a vaga reservada e o acesso ao edifício;

Cotas de emprego em empresas com mais de 100 empregados (2 a 5%): Constitui fato notório e inquestionável que o empregador, tendo diante de si uma pessoa com deficiência e outra sem, quase sempre contrata esta última, ainda que ambas apresentem a mesma qualidade curricular. Assim, não obrigar o empregado a contratar duas pessoas com deficiência para cada cem vagas fomentaria a discriminação, transferindo o sustento da pessoa com deficiência ao Estado e à sociedade, de forma indigna;

Assentos exclusivos em transporte público: O assento para uma pessoa sem deficiência representa maior conforto na viagem, enquanto para a pessoa com deficiência constitui condição para o exercício do direito de ir e vir;

Isenção na compra de carro zero: Para a quase totalidade das pessoas sem deficiência, o automóvel constitui meio de conforto, agilidade e status; para a pessoa com deficiência, porém, que sequer conta com meios de transportes e cidades acessíveis, possuir um veículo próprio é indispensável para o exercício de seus direitos como cidadão, com acesso à saúde, educação, lazer, religião etc. A isenção concedida pelo Estado, assim, acaba por diminuir as consequências de ele próprio (Estado) não cumprir com sua obrigação de proporcionar cidades com acesso universal;

Cotas nos concursos públicos (5%): Um dos fundamentos para a cota nos concursos públicos é o mesmo para as cotas nas empresas (a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho em razão das discriminações). Outra razão importante a ser observada é que: de um lado, a maioria das pessoas com deficiência tem mais dificuldade de acesso ao conhecimento; de outro, os concursos públicos sabidamente exigem conhecimento muito além daquele necessário para o bom desempenho da respectiva função. Assim, separam-se 5% das vagas para que as pessoas com deficiência concorram entre si, restando as outras 95% para a ampla concorrência.

A partir desses exemplos, fica fácil perceber que tais direitos e garantias visam aproximar as pessoas com deficiência ao máximo possível de uma vida considera comum, atendendo a essência do princípio da igualdade que, para o jurista e filósofo Rui Barbosa, consiste em “aquinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam”. Buscam essas políticas públicas eliminar barreiras físicas e atitudinais que impedem ou dificultam a efetiva inserção e participação da pessoa com deficiência na sociedade, com autonomia, segurança e dignidade.

Privilégio, diversamente, traduz a ideia de vantagem e regalia; equivale a conferir a determinadas pessoas vantagens em relação a outras iguais a ela. Assim, ainda nas palavras de Rui Barbosa, a “desigualdade flagrante” ocorreria justamente se atendidas as “reivindicações” aludidas, pois equivaleria a “tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade”.

Portanto, os direitos e garantias destinados às pessoas com deficiência relativamente àquelas que não têm deficiência não são privilégios, devendo ser firmemente defendidos por toda a sociedade!

Wemer Hesbom (Defensor Público no DF)
Da redação do Gama Cidadão

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Israel Carvalho

Israel Carvalho é jornalista nº. DRT 10370/DF e editor chefe do portal Gama Cidadão.

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