Espaço Cultural
A cultura livre – Pólvora Galeria: A juventude criativa do Gama
Mesmo com pouco tempo de existência, a galeria de arte acumula iniciativas culturais no Gama
Adriana Izel, Rebeca Oliveira, Geovanna Gravia* e Alexandre de Paula e Isabella de Andrade – Especiais para o Correio Braziliense – 05/01/2016
Esta série de reportagem busca dar luz a cultura invisível ao Plano Piloto, mas que tem extrema relevância dentro das regiões administrativas do DF. No capítulo anterior, falamos sobre o Espaço Imaginário Cultural, em Samambaia. Hoje a série segue para o Gama.
Uma pequena porta e um nome escrito a giz na parede da Quadra 25 do Gama marcam a entrada da Pólvora Galeria, criada há cerca de quatro meses por um grupo de jovens artistas da cidade, entre eles, Christian Caffi e Luana Raissa. Com a ideia de incentivar a produção autoral e misturar diversas linguagens, os brasilienses investiram na cena teatral que se concentra no Gama e do trabalho de criação e circulação feito pelos artistas da cidade.
Entre os grupos que movimentam o teatro no Gama estão a Cia. teatral Semente, a Cia. Bagagem e a Lábios da Lua, que iniciou seus trabalhos ainda na década de 1990. Os grupos já circularam por diversas cidades e estão constantemente em cartaz no DF. Eles possuem espaço próprio para ensaios, oficinas e apresentações, além de abrirem seu espaço para outros gêneros artísticos.
Luana é artista plástica e conta que falta recurso para manter o espaço, mas a vontade sobra na hora de produzir. A curiosidade que o espaço desperta na comunidade mostra que o trabalho pode crescer e render bons frutos. A galeria foi montada com ares de arte urbana inserida em um contexto aconchegante por ser tratar de uma casa. Do lado de dentro, no quarto, os equipamentos musicais dividem espaço com o camarim dos artistas. O corredor foi decorado com discos, CDs, ilustrações e grafites, servindo também como continuação da cozinha, onde é preparado todo o cardápio do bar, onde são realizados os shows.
O terraço da casa, apelidado de Varandão, onde acontecem shows e mostra de filmes. Crédito: Isabella de Andrade/Esp. CB/D.A Press
A sala deu lugar a uma pequena galeria e o terraço, chamado de Varandão, transformou-se em um cinema a céu aberto. “Aqui na cidade não tem nenhum cinema, então achamos essencial colocar as mostras de filmes na programação. Queríamos fazer todas as semanas, mas a gente ainda utiliza o retroprojetor emprestado. Estamos ainda nos adaptando e usamos os recursos disponíveis”, afirma Luana.
Durante os primeiros meses de criação, a Pólvora manteve o foco em aumentar as apresentações musicais e em abrir espaço para bandas autorais do Distrito Federal. Desde o início, a ideia primordial é reunir as mais diversas vertentes artísticas, incentivando o encontro e o diálogo de quem cria com o próprio público local. “O alcance cultural não é o mesmo que o do Plano. Tem gente aqui que nunca foi ao cinema, nunca foi ao teatro. É uma desigualdade social muito grande e isso só aumenta a importância desse tipo de projeto”, afirma a artista plástica. O contato com o fazer artístico nesses espaços pode proporcionar o surgimento de novas ideias e a reflexão do indivíduo a respeito do próprio tempo. “É muito difícil ser periférico e falar que quer viver da arte, queremos que as pessoas acreditem que isso é possível”.
Christian aproveita o estúdio/camarim para ensaiar suas músicas. Crédito: Isabella de Andrade/Esp. CB/D.A Press
Christian Caffi destaca que a recepção dos moradores tem sido boa e que pessoas de todas as idades sentem curiosidade em conhecer o local, onde os eventos são sempre gratuitos. “No ano que vem planejamos realizar um circuito cultural e um festival de artes reunindo música, poesia, teatro, artes plásticas e performances. Queremos incentivar essa troca de experiência entre artistas de estilos diferentes”.
Para movimentar a cena cultural no Gama, o casal se inspirou na cena artística de lugares como Goiânia e São Paulo , que costumam abrigar pubs e centros culturais em um mesmo espaço, atraindo cada vez mais o público jovem. “Ficamos um bom tempo esperando que abrisse um novo ponto de cultura na cidade e, como isso nunca acontecia, resolvemos construir o nosso”. Os artistas destacam que a ideia é possibilitar cada vez mais pontos de convergência com os grupos de teatro da cidade, incentivando a troca artística e levando novas possibilidades ao público.
Teatro como ponto de expansão no Gama
A cena teatral é um dos pontos fortes da identidade cultural do Gama. Companhias como a Cia. teatral Semente, a Cia. Bagagem e a Lábios da Lua são responsáveis por criar um diálogo cada vez maior com a comunidade por meio dos palcos.
Enquanto isso, a Cia. Semente produz e leva espetáculos para diversos cantos do DF e do Brasil durante os últimos nove anos. Na periferia de Brasília, o grupo encontra espaço e vontade para desenvolver projetos e processos criativos. Durante o tempo de existência, a companhia levou trabalhos de qualidade para o público e mostrou produções das mais variadas, entre elas, Morte e vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, até a mais recente montagem, Miguilim inacabado, de Guimarães Rosa. Em 2016, o grupo criou o primeiro festival de teatro Semente e convidados, que aconteceu entre 1° e 15 de novembro. Oito espetáculos entraram para a programação da mostra e a ideia é que o evento se torne constante.O Semente iniciou seus trabalhos na cidade como uma companhia teatral e, atualmente, conta com espaço próprio para oficinas, ensaios e apresentações de espetáculos de teatro, dança e música.
A Lábios da Lua é uma das pioneiras no movimento cultural da cidade. Desde 1992, grupos culturais de artistas, professores e educadores trabalha para proporcionar à comunidade espetáculos teatrais de alto nível e outras atividades. Para o produtor e músico Gilmar Batista, gerente voluntário do grupo Lábios da Lua há mais de 20 anos, a aproximação de novos grupos e artistas emergentes fortalece a cena cultural da cidade. “Apesar desses grupos estarem unidos no sentido de um apoiar o outro nas produções, a gente tem um movimento por trás disso tudo”.
Ivo Mateus Teixeira, ator e músico associado da cia, ressalta que essa colaboração entre as companhias fortalece a produção na cidade: “É só com essa união que a gente vai ter a força que o pessoal centralizado em Brasília possui. A gente ainda não tem por estar tão distante um do outro e por não ter conhecimento.”
Ivo Mateus acredita que a arte pode criar novos caminhos, pensamentos e possibilidades. Crédito: Isabella de Andrade/Esp. CB/D.A Press
Teixeira acredita que a cia se preocupa com a parceria entre os grupos e em projetos que visam beneficiar outros grupos de teatro. “O objetivo, além de trazer formação de público, é subsidiar o público amador que está começando agora”, diz. O ator cita o exemplo do espetáculo Me & Mister Jones, quando “um grupo iniciante da Ceilândia veio pra cá recebeu cachê, participou, fez as apresentações e se uniu para fazer outros trabalhos com o pessoal daqui.”
Para os grupos, o mais importante é manter a produção criativa em andamento constante e ampliar cada vez mais os horizontes de quem cria na cidade. A colaboração entre as companhias de teatro funciona como um impulso para sobreviver sem incentivo e com poucos recursos. Nesse cenário, a Galeria Pólvora surge como outro ponto de experimentação coletiva.
Pólvora Galeria
Endereço: Qd 25 Ap 01 Lt 14 – Setor Oeste
Contatos: (61) 98621-3249, @polvora.galeria e https://www.facebook.com/polvora.galeria/
Atividades:Exposições,cinema,shows,oficinas.